Direito
Digital – Paradigmas para uma nova
Realidade.
INTRODUÇÃO
A proposta principal deste artigo
será a de estabelecer quais os impactos que Revolução Tecnológica a partir da
consolidação da Internet e das redes sociais têm sobre o Direito. Como o
Direito enxerga as constantes e impactantes transformações na área tecnológica
e qual o seu posicionamento a respeito. Para tanto, é necessário estabelecer um
contexto histórico que delimite as fronteiras de ambas e qual o seu ponto de
contato, como elas se estabelecem e quais as consequências sociais, jurídicas,
econômicas e políticas na pós-modernidade.
EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA – BREVE PANORAMA
O homem enquanto ser social e
político conseguiu se destacar diante dos outros animais por ser capaz de criar
tecnologias que favorecessem a sua sobrevivência. Foi assim quando dominou o
fogo, quando criou a agricultura, a matemática e o próprio Direito; a fim de
organizar a convivência entre diferentes clãs e culturas. É errado pensar que a
evolução científica e tecnológica ocorre de tempos em tempos; ela é constante,
as vezes imperceptível, outras não.
Na Idade Média, diferente do que se
imagina, as transformações tecnológicas tiveram um alcance extraordinário. O próprio
conceito de heliocentrismo, as leis da física, e a astronomia abriram caminho para
uma nova realidade humana e consequentemente do Direito que sempre acompanhou
essas Revoluções e a partir delas criou novas normas, leis e códigos.
Já na Era das Revoluções, (Hobsbawm)
os intensos avanços permitiram o nascimento da sociedade atual, marcada pela
Industria, operariado, transportes rápidos, comunicações quase que instantâneas,
dentre outras. Permitiu o alcance planetário de todos os bens produzidos pela indústria
moderna, gerando conflitos entre países, continentes e povos.
Por fim, estamos vivendo a mais das
importantes Revoluções tecnológicas criadas pelo homem, a Revolução Digital.
Ela permitiu avanços até então nunca imaginados em todos os aspectos da vida
contemporânea. Televisões inteligentes, telefones smarts, carros com
computadores de bordo, computadores extremamentes versáteis e potentes, enfim,
alterou sobremaneira nossa percepção do mundo e de nós mesmos. Até que ponto
essa Revolução irá continuar? Seremos capazes de se adaptarmos a mudanças
infinitas? Qual será o papel do Direito frente a essas constantes
transformações; como vamos definir novas leis que acompanhem essas mudanças? Ou
o Direito será o mesmo Direito de nossos pais e avós?
CIBERCULTURA
Pierre
Levy em sua famosa obra Cibercultura (1999)
descreve de forma brilhante a Revolução Tecnológica que se iniciou ainda no
final do séc. XX. Como o aperfeiçoamento tecnológico têm permitido cada vez
mais o homem deixar de frequentar espaços físicos (shoppings, cafés, cinemas)
em troca de espaços virtuais coletivos ou individuais. Quais impactos essa
substituição do analógico pelo digital gera nas nossas relações humanas? É a
mais importante como o homem se vê e se representa diante desse fenômeno? São essas
as indagações que permitiram elaborar um panorama sociológico e histórico, onde
o presente se virtualiza e o virtual se presencializa no nosso cotidiano.
Uma
das características mais importantes dessa Revolução é a interatividade entre
pessoas que estão distantes fisicamente e geograficamente. Esse hiato
geográfico alterou a percepção do indivíduo e do coletivo. Temos como
consequência imediata a intersecção do público e do privado em um mesmo
ambiente. Como o homem passa a se representar culturalmente perante essa
continua transformação. Estamos criando uma cultura multivariada, uma
diversidade linguística e histórica? Essas questões preocupam o Direito
enquanto dogma, doutrina.? Sendo o Direito uma ciência social aplicada, qual
será o seu papel epistemológico frente a mudanças tão rápidas? O Direito também
se virtualizará em algum momento histórico?
Todas essas indagações estão sendo
respondidas lentamente, até porque quando um conhecimento humano (sociologia,
história, geografia, antropologia, economia e educação) tenta interpretar
determinado momento, já está prestes a
nascer um novo. Pierre Levy destaca como uma das possíveis respostas é a que o
homem se torna coletivo no espaço individual e se torna individual no espaço
coletivo, graças ao espantoso desenvolvimento tecnológico vivenciado nos últimos
dez anos. Outra possível resposta indica que o homem alterou sua forma de
aprender o mundo, principalmente no que diz respeito as novas invenções, aos
novos modelos de aprendizagem cultural
Nunca na humanidade o homem pode
manter contato com culturas tão distantes e complexas como o atual momento. As inovações
técnicas permitiram um contato quase que físico com culturas longínquas,
oferecendo possibilidades de interação, como também de ódio, xenofobia e
violência. Transações financeiras e comerciais que levavam dias e meses; hoje
podem ser realizadas em questões de minutos.
Levy, contudo, destaca que a
facilitação da tecnologia na redução do espaço e do tempo, também abre caminho
para uma profunda dominação econômica, social e jurídica. É a partir dessa
colonização tecnológica levada a sério pelos países centrais que os conflitos étnicos,
religiosos, linguísticos, têm se expandido ano após ano. Como o Direito trata
tais questões? Quais caminhos a doutrina, a jurisprudência, os tribunais
nacionais e internacionais devem tomar no sentido de equacionar conflitos cada
vez mais exacerbados? Como será positivado as relações familiares, escolares,
comerciais e principalmente jurídicas diante de mudanças quase que diárias? Frente
a tantas interrogações o Direito ainda está se perguntando: Como vou resolver
isso.
O
DIREITO E A TECNOLÓGIA
Para a convivência social o homem
teve que estabelecer regras de conduta, o zoon politikon na visão de (Aristóteles).
Estabeleceu regras de comportamento, para que todos do grupo pudessem
sobreviver e assim perpetuar a espécie. Foi assim também com a evolução tecnológica
desde a Idade da Pedra até a pós-contemporaneidade, onde toda a evolução
cientifica foi sucedida de leis e normas que pudessem favorecer o convívio social
e coletivo.
Ainda
na Mesopotâmia foram criados os primeiros códigos que passaram a existir a fim
de favorecer o pleno desenvolvimento agrícola, arquitetônico e matemático. O Direito
era criado antes de muitos eventos científicos se tornarem realidade; O Direito
andava quase que lado a lado com o desenvolvimento tecnológico. No entanto ao
longo dos séculos as normas que estabeleciam a convivência foram perdendo
espaço para as constantes e inevitáveis evoluções cientificas e tecnológicas. Foi
na Idade Média com o Direito canônico que ele estacionou, levando
consequentemente para a fogueira muitos cientistas que avançavam na
interpretação dos fenômenos físicos.
Somente
após a Iluminismo e com a Revolução Francesa o Direito voltou a acompanhar as
mudanças sociais e principalmente cientificas, tudo para o favorecimento da
classe burguesa, agora detentora do poder político. Nesse sentido boa parte das
normas ainda existentes e que estão em vigor no ordenamento jurídico pátrio e
de muitas nações nasceram sob a filosofia Iluminista, e isso perdurou durante
mais de duzentos anos.
O
grande salto, todavia, foi dado com a Revolução Industrial, quando todas as
transações econômicas, políticas e comerciais passaram a ter uma fundamentação
legal, garantindo segurança para os contratantes e a autonomia do Estado,
detentor do poder jurídico. É de se destacar que durante todo esse período o
Direito oferecia respostas para quase todo tipo de litigio, o Direito estava
adaptado às condições materiais de produção desse momento, e foi assim até o
final do século XX.
DIREITO
DIGITAL – UM NOVO PARADIGMA
Foi
com a liberação pelos Estado Unidos da internet civil que todo o mundo moderno
veio ruir. O seu desenvolvimento e expansão foram vertiginosos nas últimas duas
décadas, oferecendo para a população uma gama infinita de redes de interação,
redes de jogos, de negócios, de exposição cultural, de navegação terrestre,
etc. O Direito que estava fundado em Instituições consolidadas (Direito Civil,
Penal, Comercial, Tributário), a séculos, depara-se agora com um novo paradigma social,
as relações virtuais dos mais variados contextos. A fronteira cientifica toca na
fronteira jurídica. O que fazer agora?
O nascimento de uma nova disciplina
jurídica que regule o espaço virtual, somente começou a ser pensada a pouco
mais de dez anos (2005), a necessidade de uma regulação jurídica tornou-se
essencial perante a realidade. Como garantir direitos e deveres, como
estabelecer uma pena criminal quando os agentes estão separados por milhares de
quilômetros. Foi pensando nisso que os países do hemisfério norte criaram as
primeiras normas (legaltechs / lawtechs) que garantissem segurança e
privacidade para os usuários da rede mundial, normas que ainda precisam de
aperfeiçoamento filosófico e jurídico, contudo o Direito passou a dar os
primeiros passos no sentido de acompanhar o mundo virtual.
DIREITO
DIGITAL NO BRASIL - PERSPECTIVAS
Vale
lembrar que o Brasil somente a pouco tempo atrás, tomou as primeiras
iniciativas legais de regulação eletrônica. Lei: 12.965/14 – Marco civil da
Internet e a Lei: 12.737/12 – Lei Carolina Dieckmann, que alterou o Código Penal,
incluindo agora os crimes cibernéticos como tipo penal. Ainda há a ausência de normas até de caráter constitucional
que ofereçam uma principiologia que oriente normas infralegais. O Marco Civil
da Internet pode ser considerada uma lei
de vanguarda no cenário jurídico nacional e internacional, pois, disciplina os
direitos e deveres de provedores, de usuários, da proteção de dados pessoais,
da intimidade, da violação de correspondência; garante a liberdade de expressão
respeitados os limites legais, criminaliza condutas antes desconsideradas.
Todavia
existe ainda a ausência de diferentes normas que garantam segurança jurídica para
diferentes atores sociais, que hoje usam como plataforma de trabalho a rede
mundial de computadores. Como exemplo destacamos as startups que buscam na
inovação tecnológica sua sobrevivência financeira. Cada dia mais presentes nas
universidades do Brasil, as incubadoras de negócio ainda se sustentam sobre um
Direito criado e pensado nos moldes da Revolução Industrial.
STARTUP
Conhecidas
como empresas emergentes as startups revolucionaram o diálogo da ciência com o
Direito. Toda startup nasce de uma ideia, uma ideia que para se transformar em realidade exige, tempo,
investimento, criatividade e perseverança. Atualmente é um dos ramos mais
interessantes na aplicação de novas tecnologias que logo chegam ao público em
forma de aplicativos, telemarketing, atendimento virtual e hoje na área do
Direito os famosos programas de software que ajudam a maximizar a administração
de um escritório.
No
entanto mesmo sendo utilizada para diferentes fins as startups necessitam de
amparo legal, para que não enfrentem problemas futuros com seus clientes ou com
os órgãos governamentais que por lei fiscalizam o recolhimento de tributos, a
violação de direitos do consumidor ou mesmo direitos pessoais.
Como
no Brasil a legislação que regula o trabalho via internet ainda é escassa,
aplica-se por analogia outras instituições jurídicas que garantem o
funcionamento adequado dessas empresas iniciantes. Desta forma para que uma
empresa emergente possa funcionar legalmente será necessário uma assessoria
jurídica que mostre como o Direito aplica-se, possíveis riscos e possíveis
demandas judiciais. Um exemplo claro disso é o uso de aplicativos de mobilidade
urbana (Uber) que têm gerado fortes e acaloradas discussões jurídicas, econômicas
e políticas, já que quebrou uma reserva de mercado dominada a anos pelos clássicos
taxis. Quando o Direito deve ser aplicado em situações como essas, onde não há
um amparo legal claro e objetivo que ofereça segurança jurídica para os
trabalhadores taxistas e garanta ao mesmo tempo a liberdade de concorrência, a
livre iniciativa.
Esse
exemplo é só a ponta do iceberg do que está por vir, pois na ausência de um
ordenamento legal, corre-se o risco do uso da força por aqueles que desejam ter
seus direitos garantidos sobre os demais, o que é inadmissível em um Estado
pautado pelo Direito.
Cabe
ao advogado como garantidor dos direitos individuais e coletivos, fomentar a
discussão com toda a sociedade, com o Estado, com a iniciativa privada na busca
de uma solução legal e amparada pela constituição que garanta o pleno
funcionamento das inovações tecnológicas a cada dia mais presentes em nossas
vidas.
São
poucos advogados no Brasil que sabem interpretar as mudanças do mundo digital,
entender seus conceitos, seus objetivos e adapta-los à dogmática jurídica. Necessariamente
haverá pelos próximos anos normas legais que tenham não somente direitos e
deveres, penas (texto jurídico apenas) mas que também contenha elementos (Expressões,
palavras) de natureza eletrônica; e que para o operador de Direito formado na
escola clássica será um grande obstáculo, pois, aplicar o Direito sobre aquilo que
pode mudar a qualquer instante é um desafio para os operadores do Direito, para
as Universidades, Tribunais, e para toda a sociedade, que depende desse
profissional para a garantia de seus direitos.
CONCLUSÃO
O
presente artigo buscou discutir de forma panorâmica a influência que a Revolução
Tecnológica trouxe para o Direito, partindo de um contexto histórico traçou o
desenvolvimento paralelo de duas formas de conhecimento indispensáveis para a sobrevivência
humana. Procurou esclarecer quanto de impacto a Tecnologia exerce sobre o
Direito e como o Direito enxerga tais mudanças. Fez um recorte especifico nas
startups que hoje desenvolvem tecnologias que logo serão usadas pela população
e qual a regulação jurídica que discipline essa nova forma de produzir.
Trouxe
também a atual realidade do Brasil, que como outros países ainda não
desenvolveram normas legais que ofereçam segurança jurídica para os usuários da
internet e o papel do advogado na aplicação do direito perante tais
transformações tecnológicas.
O
artigo não se esgota em si. A proposta aqui é abrir caminho para um diálogo saudável
e construtivo em uma nova área jurídica que logo em breve será tema de
investigações, doutrinas e jurisprudências.
BIBLIOGRAFIA
HOSBAWM.
Eric. A Era das Revoluções –
Companhia da Letras. 2000
Lei.
12.965 – Planalto.
Lei.
12.737 – Planalto.
LEVY,
Pierre. Cibercultura – Editora 34.
1999.
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